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Perícia de Periculosidade

Perícia de Periculosidade (NR-16): Guia para Advogados

Inspeção periculosidade elétrica

No cenário da Justiça do Trabalho, a perícia de periculosidade desempenha um papel para determinar se um empregado faz jus ao adicional de periculosidade. Este direito, aliás, está amparado pela Norma Regulamentadora 16 (NR-16) do Ministério do Trabalho e Emprego. Para advogados, compreender os fundamentos e as nuances desta perícia é, portanto, essencial para a condução eficaz de processos e a elaboração de laudos robustos.

Este guia completo explora os aspectos técnicos e jurídicos da perícia de periculosidade, com foco nas atividades que oferecem risco potencial à integridade física do trabalhador, especialmente no que tange à Segurança do Trabalho.

O Que é a Perícia de Periculosidade e Sua Importância?

A perícia de periculosidade é uma avaliação técnica realizada por um engenheiro de segurança do trabalho ou médico do trabalho, cujo objetivo é verificar se as atividades laborais de um empregado o expõem a condições de risco acentuado. Este risco, por sua vez, pode levar à morte, lesões graves ou perda da capacidade laboral, conforme preconiza o Art. 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A importância dessa perícia reside na sua capacidade de subsidiar o juiz com elementos técnicos para uma decisão justa.

De fato, o laudo pericial é a principal prova técnica em processos que envolvem o adicional de periculosidade, sendo indispensável para trazer a verdade dos fatos. Assim, a qualidade e a fundamentação do laudo são determinantes para o desfecho da lide.

Fundamentação Legal: A NR-16

A Norma Regulamentadora 16 (NR-16) é o alicerce legal para a caracterização da periculosidade. Ela estabelece as atividades e operações consideradas perigosas e que, consequentemente, garantem ao trabalhador o direito ao adicional de 30% sobre o salário-base. Em suma, a NR-16 abrange as seguintes categorias de riscos:

  • Atividades e Operações Perigosas com Explosivos: Este anexo detalha as condições de fabricação, transporte, armazenamento e manuseio de explosivos. Por conseguinte, qualquer falha nestes processos pode resultar em consequências catastróficas.
  • Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis: Similarmente, esta seção aborda o manuseio, transporte e armazenamento de líquidos e gases inflamáveis, ressaltando os riscos de incêndio e explosão.
  • Atividades e Operações Perigosas com Energia Elétrica: Sem dúvida, um dos pontos mais relevantes para a Engenharia Elétrica. A NR-16 regulamenta o trabalho em instalações elétricas energizadas ou em suas proximidades, definindo áreas de risco e procedimentos de segurança.
  • Atividades e Operações Perigosas com Radiações Ionizantes ou Substâncias Radioativas: Embora menos comum em algumas áreas, esta parte da norma trata da exposição a radiações, que também representam risco significativo à saúde.
  • Atividades e Operações Perigosas com Exposição a Roubos ou Outras Espécies de Violência Física nas Atividades Profissionais de Segurança Pessoal ou Patrimonial: Este anexo foi incluído posteriormente para abranger profissionais que atuam na área de segurança.
  • Atividades e Operações Perigosas com Substâncias Perigosas: Recentemente, a norma passou por atualizações para incluir outras substâncias que, por sua natureza, podem causar danos graves.

Para uma análise pericial aprofundada, o perito judicial deve conhecer meticulosamente cada anexo da NR-16, bem como suas portarias e notas explicativas.

Metodologia da Perícia: Análise Técnica e Visita ao Local

A execução da perícia de periculosidade segue um rito processual e técnico bem definido. Em primeiro lugar, o perito judicial é nomeado pelo juiz, e as partes são intimadas a apresentar seus quesitos. Posteriormente, o perito agenda a diligência, que consiste na visita ao local de trabalho do reclamante.

Durante a visita, o perito realiza uma análise criteriosa das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, dos equipamentos utilizados, dos produtos manuseados e do ambiente de trabalho como um todo. Além disso, é fundamental que o perito dialogue com o reclamante, com o representante da empresa e com outros trabalhadores que executam funções similares, a fim de coletar o máximo de informações relevantes. O perito busca, com efeito, confirmar se a exposição ao agente perigoso é permanente, intermitente ou eventual, pois essa distinção é crucial para a caracterização do adicional.

Para tanto, são utilizados diversos recursos técnicos, incluindo:

  • Documentação: Análise de PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais), PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), laudos de inspeção, ordens de serviço, fichas de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), entre outros.
  • Inspeção Visual: Observação direta das condições de trabalho, layout do ambiente, sinalização de segurança e proximidade com as fontes de risco.
  • Entrevistas: Conversas com o trabalhador, supervisores e colegas para entender a rotina e a percepção dos riscos.
  • Medições (se aplicável): Em alguns casos, pode ser necessário o uso de equipamentos para medir grandezas como intensidade de campo elétrico ou concentração de gases, embora na periculosidade a natureza do risco seja o foco principal.

A diligência deve ser exaustiva e imparcial, garantindo que todos os elementos pertinentes sejam considerados.

Riscos Elétricos e a NR-10: Um Aliado na Perícia de Periculosidade

Riscos elétricos NR-10

Quando se trata de periculosidade por energia elétrica, a NR-16 atua em conjunto com a Norma Regulamentadora 10 (NR-10), que estabelece os requisitos e condições mínimas para garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores que interagem com instalações e serviços em eletricidade. Dessa forma, um perito com expertise em Engenharia Elétrica tem um diferencial significativo para avaliar estes casos.

A NR-10 define as zonas de risco, como a Zona de Risco Controlada (ZRC) e a Zona de Risco Restrita (ZRR), e determina a necessidade de medidas de controle, como o uso de equipamentos de proteção coletiva (EPC) e individual (EPI), além de procedimentos de trabalho seguros. Portanto, a ausência ou a ineficácia dessas medidas são pontos críticos a serem observados na perícia.

É fundamental que o perito avalie a conformidade da instalação e dos procedimentos com as diretrizes da NR-10. Por exemplo, se um eletricista opera em proximidade de circuitos energizados sem as devidas precauções, a periculosidade é evidente. Da mesma forma, a falta de treinamento adequado ou de equipamentos de segurança apropriados reforça a exposição ao risco.

Desafios na Análise de Atividades Perigosas: Substâncias e Exposição

Substâncias perigosas

A análise de atividades com substâncias perigosas, como inflamáveis e explosivos, apresenta desafios específicos para o perito. É preciso, primeiramente, identificar a natureza da substância, sua classificação de risco e a forma como o trabalhador interage com ela. A quantidade armazenada, o tipo de recipiente e a ventilação do ambiente são fatores cruciais.

Por exemplo, um frentista de posto de gasolina, ao abastecer veículos, está exposto a vapores inflamáveis de forma intermitente, o que o enquadra na periculosidade. Entretanto, a exposição de um funcionário de escritório que apenas transita ocasionalmente por uma área de armazenamento de inflamáveis pode não configurar o direito ao adicional, dependendo do tempo e da forma de exposição. A avaliação da intermitência ou habitualidade da exposição é, portanto, um ponto-chave.

Para aprofundar essa análise, o perito deve consultar as fichas de segurança dos produtos (FDS – Ficha de Dados de Segurança, anteriormente conhecida como FISPQ – Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos), normas técnicas aplicáveis e literatura especializada em segurança química.

Laudo Pericial: Clareza e Fundamentação para o Judiciário

A elaboração do laudo pericial é a etapa final e decisiva da perícia. O perito deve redigir o documento de forma clara, objetiva e, sobretudo, com sólida fundamentação técnica e legal. É imperativo que o laudo responda a todos os quesitos formulados pelas partes e pelo juízo de forma direta e concisa.

O laudo deve conter:

  • Introdução: Contextualização do processo e do objeto da perícia.
  • Histórico: Detalhamento da função do reclamante, suas atividades e o período de trabalho.
  • Diligência Pericial: Descrição da visita ao local, incluindo data, horário e pessoas presentes.
  • Análise Técnica: Fundamentação técnica da avaliação, com referência às normas e legislação pertinentes (NR-16, NR-10, CLT, etc.). Aqui, é fundamental citar as passagens específicas das normas que embasam a conclusão.
  • Resposta aos Quesitos: Respostas individualizadas aos quesitos das partes, sempre de forma técnica e fundamentada.
  • Conclusão: Parecer final do perito sobre a existência ou não da periculosidade, indicando o enquadramento na NR-16.
  • Anexos: Documentos de apoio, fotos do local, croquis e quaisquer outros elementos que corroborem as conclusões.

É importante que a linguagem do laudo, embora técnica, seja acessível aos operadores do Direito que não possuem formação em engenharia. Assim, o uso de analogias e exemplos práticos pode auxiliar na compreensão. Por conseguinte, um laudo bem redigido e fundamentado não apenas facilita o trabalho do juiz, mas também minimiza a necessidade de esclarecimentos adicionais e, eventualmente, de uma nova perícia.

Assistência Técnica e Impugnação do Laudo: O Papel dos Advogados

Para os advogados, tanto do reclamante quanto da reclamada, a atuação da assistência técnica é um diferencial estratégico. O assistente técnico é um profissional especializado na área objeto da perícia, contratado pelas partes para acompanhar a diligência, formular quesitos complementares, auxiliar na interpretação de termos técnicos e, se for o caso, impugnar o laudo pericial.

A impugnação do laudo pericial ocorre quando uma das partes discorda das conclusões do perito. Neste momento, é crucial que a impugnação seja bem fundamentada, apontando falhas técnicas, omissões ou interpretações equivocadas da norma. Ademais, o assistente técnico pode elaborar um parecer divergente, oferecendo ao juiz uma segunda opinião técnica.

Ao preparar uma impugnação ou um parecer, os advogados devem atentar para:

  • Conformidade com a NR-16 e NR-10: Verifique se o perito aplicou corretamente as normas e se a caracterização da periculosidade está em consonância com os anexos.
  • Coleta de Provas: Avalie se todas as evidências foram consideradas e se a metodologia de coleta de dados foi adequada.
  • Exposição ao Risco: Analise se a caracterização da exposição (permanente, intermitente, eventual) está correta e se a interpretação do perito reflete a realidade da função.
  • Fundamentação Técnica: Verifique a solidez dos argumentos técnicos apresentados no laudo.

Conclusão: A Importância do Perito Qualificado

Em suma, a perícia de periculosidade é um procedimento complexo que exige profundo conhecimento técnico e legal. Para advogados, entender os meandros da NR-16 e suas intersecções com a Engenharia de Segurança do Trabalho é crucial para defender os interesses de seus clientes. Por outro lado, para o perito judicial, a qualificação e a experiência são indispensáveis para a elaboração de laudos precisos, imparciais e que realmente auxiliem o juízo na tomada de decisões.

A busca contínua por conhecimento e a atualização sobre as novas portarias e entendimentos jurisprudenciais são, portanto, pilares para todos os envolvidos nesse campo do Direito do Trabalho.